Mesmo com burocracia e falta de financiamento, pequenas e médias empresas começam a conquistar o mercado internacional.
Alguns caminhoneiros irlandeses nem sequer imaginam que carregam em seus veículos de carga um produto desenvolvido pela gaúcha Tlantic, de Porto Alegre, empresa de desenvolvimento de aplicações focadas no varejo. O software, que funciona em um celular ou mesmo em um terminal semelhante ao das máquinas de cartão de crédito, está integrado ao estoque da Musgrave Retail Partners, a maior distribuidora de alimentos daquele país. Toda vez que uma mercadoria é entregue a um varejista, basta ao caminhoneiro dar baixa no item que ele sai do inventário da distribuidora. Enfrentar a concorrência de pesos-pesados do segmento de soluções móveis para varejo, como SAP e Oracle, as duas maiores fornecedoras de software para empresas do mundo, foi somente uma das barreiras enfrentadas pela equipe da Tlantic, para exportar para um país europeu.
Alfredo Novais, da ABN8: empresa paulista começou a exportar suco de açaí para a China.
Próximo destino é levar a Cingapura e à Malásia um energético derivado do guaraná “Além dos desafios tecnológicos, como o da compatibilidade com vários tipos de dispositivos de hardware, tivemos de lidar com diferenças culturais dos varejistas daquela região geográfica”, afirma Reginaldo Back, diretor da Tlantic. Para conquistar o cliente irlandês, a empresa se esforçou muito, apesar de não precisar ir até Cork, segunda cidade mais populosa da Irlanda, sede da Musgrave. Remotamente, fez um levantamento das necessidades da companhia. E, por fim, desenvolveu um teste piloto de seu software. Tudo isso em um prazo exíguo de três meses. Com essa agilidade, ela conseguiu convencer os irlandeses a assinar o contrato. Fundada em 2004, a Tlantic tem 130 funcionários e conta entre os seus acionistas com a portuguesa Sonae, holding que detém participações em empresas de varejo, shopping centers e tecnologia.
Com faturamento de R$ 20 milhões em 2010, a empresa, atualmente, já exporta para Portugal, África do Sul, Arábia Saudita, Espanha, Irlanda e Turquia. A Tlantic é um exemplo de que não é preciso ser uma grande empresa, como a BRFoods, Vale ou Petrobras, para conquistar espaço no mercado internacional. Mesmo pequenos negócios podem pensar grande e se lançar rumo ao Exterior em busca de clientes. É fato que a trajetória para fora das fronteiras brasileiras nem sempre é fácil. Há ainda muitos gargalos estruturais para serem vencidos. De acordo com pesquisa do Comitê de Comércio Exterior, do Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, os principais problemas enfrentados pelos empresários locais são a dificuldade para obtenção de crédito, o elevado custo da exportação e a pesada carga tributária. O estudo, feito neste ano, ouviu 131 pequenas e médias empresas.
Reginaldo Back, da Tlantic: caminhoneiros da Irlanda usam software da companhia gaúcha, que já exporta suas soluções para sete países
Talvez por causa desses entraves, as micro e pequenas empresas parecem não estar muito interessadas em exportar. Dados do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP) afirmam que apenas cerca de 1% do volume de dólares exportados vem desse segmento. “Isso é um erro que precisa ser sanado”, afirma Bruno Caetano, diretor-superintendente do Sebrae-SP. “Muitas oportunidades estão sendo perdidas pelas empresas de pequeno porte.” Não foi o que aconteceu com a ABN8, de São Paulo, trading que dá assessoria a empresas que querem exportar ou importar. Recentemente, a companhia descobriu um verdadeiro “negócio da China”: vender suco de açaí para os chineses. A oportunidade de colocar o produto amazônico nas prateleiras de Hong Kong e Pequim começou em abril deste ano. Segundo Alfredo Novais, diretor da ABN8, o produto teve rápida aceitação no país asiático, devido às suas propriedades antioxidantes e fitoterápicas únicas.
Os chineses já conhecem a fruta em três sabores: puro, com banana e com guaraná. Envasar o suco em embalagens longa vida de um litro foi um jeito de se adequar à realidade do consumidor chinês. O próximo passo, de acordo com Novais, será a exportação do líquido em quantidades menores. “Vamos vender em embalagens de 250 ml”, afirma Novais. “Essa pequena alteração vai aumentar o poder de penetração do produto, pois facilita o consumo imediato.” Uma vez abertas as portas chinesas, outras oportunidades começam a surgir para a ABN8. A trading brasileira planeja vender para o Sudeste Asiático, em países como Cingapura e Malásia. Além do açaí, a intenção é ampliar o leque de produtos “exóticos” e levar uma bebida energética natural à base de guaraná, chamada Caff. Como uma empresa descobre que tem vocação para a exportação?
“A decisão para exportar é um processo natural de crescimento da empresa, observado aí o empreendedorismo do empresário e o comprometimento de sua equipe”, diz Miriam Ferraz, coordenadora do Programa de Internacionalização da Cadeia Produtiva de Petróleo e Gás. Esse é o caso do Grupo Colmeia, pequena empresa com 20 anos de mercado. Com sede em Esteio, no Rio Grande do Sul, a companhia, que fabrica contêineres habitáveis para ambientes de trabalho e eventos, começou a exportar neste ano. Dos 15 milhões de faturamento previsto para 2011, 20% será de vendas para o Exterior.
É de olho nessas pequenas empresas que o Sebrae resolveu se estruturar para dar apoio à exportação. A seccional São Paulo, por exemplo, criou, há cerca de dois meses, a Gerência Internacional. A nova divisão tem dois objetivos bem claros: incentivar a internacionalização das micro e pequenas empresas e divulgar institucionalmente o nome do Sebrae no Exterior.
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