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segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O que Mickey pode ensinar a você - Entrevista: David Mulvey

O que Mickey, Minnie, Pateta e outros personagens clássicos do universo infantil têm a ver com o seu negócio? Segundo David Mulvey, diretor do Disney Institute, o império criado por Walt Disney pode oferecer muitas lições ao universo corporativo.

"Nossa função não é explicar o pó mágico ou a parada no Magic Kingdom, mas sim mostrar por que eles existem, qual é a sua função, qual é a estratégia de negócios por trás disso tudo", diz Mulvey, principal palestrante do Disney Institute e que esteve em São Paulo na semana passada para se reunir com um grupo de empresários. Na bagagem, trouxe a experiência de palestras ministradas para funcionários de corporações como Kraft, Delta Airlines e até para o Exército dos Estados Unidos. Na entrevista a seguir, Mulvey revela alguns truques da Disney

DINHEIRO - O que a Disney tem a ensinar a empresários e empresas? 

DAVID MULVEY - Ensinamos o básico, que muitas vezes é o mais difícil de ser colocado em prática numa empresa. São conceitos que tiramos de nossa experiência na própria Disney, como a importância de engajar e valorizar os funcionários e a necessidade de atualizar processos e práticas constantemente. Nossa mensagem básica é que é necessário prestar atenção aos detalhes, pois são eles que fazem a diferença.

DINHEIRO - Como fazer as coisas certas corretamente?

MULVEY - Para começar, ajudando a mudar alguns conceitos de forma positiva. Por exemplo, todo mundo diz que o cliente vem sempre em primeiro lugar. Será? Para nós, é preciso primeiro olhar para si mesmo, para poder desenvolver aquilo que é necessário e, então, oferecer o que o cliente quer e colher os resultados. Outra máxima diz que o consumidor tem sempre razão. É a mesma coisa: às vezes eles não têm razão. Esse é o tipo de perspectiva diferente que oferecemos

DINHEIRO - Como isso funciona?
MULVEY - Há uma infinidade de livros, seminários e coisas do gênero sobre como colocar isso em prática e manter a qualidade do serviço. A maioria diz que é preciso impressionar o cliente, tirar dele um grande "uau!" Nosso segredo na Disney, que na verdade não é segredo, é trabalhar nos detalhes. Mostramos isso em nossos seminários. Fazendo as coisas corretamente, colecionamos um grande número de pequenos "uaus" que cativam as pessoas. Temos nossos parques, que causam grandes "uaus", mas sabemos que não é possível sustentar um negócio indefinidamente dessa forma, com esse deslumbramento. É inviável.

DINHEIRO - De que forma é possível conseguir isso?

MULVEY - Posso resumir nosso segredo em uma frase: fazemos mágica como um mágico, com trabalho duro e muito treino, antes mesmo de o show começar Para as outras empresas, o necessário é descobrir qual sua própria mágica e definir o que precisam fazer para melhorá-la. Na Disney é assim. Não é a mágica que faz a Disney funcionar, é o trabalho.

DINHEIRO - Como transformar o que existe na Disney, algo tão único, em exemplos para outras empresas? 

MULVEY - Realmente, quando se pensa na Disney, são as paradas, o pó mágico, a fantasia que vêm à mente. Para um empresário ou industrial, é fácil deixar isso de lado, pois parece algo irrelevante. Nesses seminários, no entanto, apresentamos a estratégia envolvida nessas ações e a função em nosso negócio. Por meio desses elementos, mostramos como pensamos, falamos de nossas táticas de negócio e provamos que só fazemos paradas e o show de pó mágico porque isso faz sentido comercial.

DINHEIRO - Tudo é planejado? 

MULVEY - Definitivamente. A Disney é a empresa que mais planeja na qual já trabalhei. Tudo o que fazemos tem um motivo, que pode não ser óbvio à primeira vista. Se já erramos? Claro que sim, mas nada do que fizemos até hoje foi por acidente. Garanto que não haveria show de pó mágico ou paradas se não ganhássemos nada com isso. E é essa nossa mensagem. O que é importante não é tanto o que fazemos, mas por que fazemos todas essas coisas.

DINHEIRO - E como as empresas usam esse conhecimento?

MULVEY - O que precisam fazer é traduzir essas experiências que apresentamos para suas próprias organizações. O que eles têm de fazer é pensar: "Bem, agora eu sei como fazer. Tenho apenas que descobrir uma forma de aplicar isso que aprendi." Nós mostramos como é o negócio por trás da nossa mágica. Daí para a frente, é importante que a pessoa aplique o que aprendeu da melhor forma.

DINHEIRO - Elas realmente conseguem aplicar esses conhecimentos? 

MULVEY - Normalmente as pessoas saem dizendo que tiveram grandes ideias depois do seminário. Mas o que digo para elas é que, embora isso seja valioso, o que realmente importa é saber o que fazer com essas ideias. Por isso incentivo todos os presentes a sempre pensar no "e daí?". Ou seja, para tudo o que eu digo, espero que eles se perguntem: "O que isso interessa para mim e para a minha empresa?" Daí conseguem tirar lições do que eu falo, lições que verdadeiramente farão alguma diferença em suas organizações.

DINHEIRO - De que maneira as empresas recebem essas ideias?

MULVEY - Quando alguém volta para sua empresa falando apenas da Disney, isso é um problema. Seus colegas vão achar que ele sofreu uma lavagem cerebral induzida por pó mágico e simplesmente não vão prestar atenção. Nesses casos, a recepção não é boa, evidentemente. Por isso é preciso ser muito prático, pensando cada ideia antes de aplicar e começar devagar. Com os pequenos "uaus" que mencionei, por exemplo.

DINHEIRO - Isso vale também para lideranças nas companhias? 

MULVEY - Sim, claro. É uma das principais mensagens que tentamos passar: que é preciso engajar o grupo todo, para o bem da empresa. Fazemos isso na Disney e temos bons resultados. Por isso, não adianta o líder voltar para a empresa e dizer: "Estive no seminário da Disney e decidi que vamos fazer isto e aquilo." O certo seria afirmar: "Estive no seminário da Disney e aprendi isso aqui. O que vocês acham? Como podemos adaptar isso para nossa empresa?" Esse é o tipo de atitude que ajuda a envolver e valorizar as pessoas e já é, em si, uma ótima mudança.

DINHEIRO - Esse seminário já foi visto por vários empresários e executivos de empresas como GM, Kraft, Delta Airlines, e até mesmo pelo Exército dos EUA. A experiência da Disney realmente ajuda organizações tão diferentes entre si e diferentes da própria Disney?

MULVEY - Definitivamente. Afinal, nos concentramos em conceitos muito básicos, que são comuns a qualquer tipo de organização de pessoas. E acreditamos que boas práticas de negócios são boas para qualquer um, seja você a Disney, uma indústria ou qualquer outro tipo de organização. Além disso, embora básicos, esses conceitos que apresentamos são, para essas companhias, uma espécie de lufada de ar fresco. Sempre é bom ter uma perspectiva diferente sobre seu próprio negócio Praticamos isso dentro da Disney. E, certamente, é algo que ajuda bastante essas empresas. Afinal, elas ficaram contentes o bastante para nos permitir usar seus nomes na divulgação de nosso seminário.

DINHEIRO - Que tipo de lufada é essa que o senhor oferece?

MULVEY - São coisas, como disse, simples, mas que fazem grande diferença quando pensadas detalhadamente. Posso dar um exemplo: na Disney, temos regras de conduta para quem atende o público. Mas não nos limitamos a dizer simplesmente: "Seja cortês." Há recomendações específicas, como olhar nos olhos, sorrir. Realmente é algo muito detalhado. Mesmo assim, essas recomendações são revistas sempre, para que não se tornem ineficazes Criar simplesmente um guia de conduta e afixar na parede não adianta. Em duas semanas esse quadro passa a ser apenas papel de parede. Esse tipo de experiência, que oferece uma nova perspectiva, é muito benéfico para empresas que se mantêm anos com a mesma estrutura, com o mesmo jeito de fazer negócios. Quando perdem espaço, ficam sem saber o que aconteceu. Começamos todos os nossos cursos falando em bom senso, para então chegar às boas práticas de negócio.

DINHEIRO - Como o sr. resumiria, em poucas palavras, o seu seminário? 

MULVEY - O que diria às pessoas é que sempre há opções. Que é necessário examinar a si próprio, a sua companhia, seus funcionários, seus processos Enfim, fazer uma grande análise em tudo, constantemente. E perceber que sempre há espaço para melhorar. Sempre há opções para fazer as coisas de forma diferente, e melhor. Ressaltaria também a importância de engajar as pessoas. Sem elas, sem sua paixão, tudo fica muito mais difícil.

DINHEIRO - O sr. já trabalhou, de forma voluntária, na preparação de mesas e banquetes, na gerência de hotéis, na supervisão de personagens. O que o motivou a realizar tantas funções diferentes na Disney? 

MULVEY - Na Disney, somos encorajados a, nos períodos de alta temporada, quando o trabalho é maior, nos candidatarmos para atuar, voluntariamente, em áreas diferentes da nossa que precisem de algum reforço. Ninguém vai cortar seu salário se você não fizer isso, mas sempre é interessante e quase todos fazemos. É uma forma de oferecer caminhos para quem quer mudar de área dentro da própria Disney. Além disso, é uma demonstração do engajamento de toda a equipe. É uma mensagem forte para quem está na linha de frente. Eles enxergam essa iniciativa, especialmente de pessoas de liderança, como apreço por sua contribuição.

DINHEIRO - Essa experiência o ajudou de alguma forma? 

MULVEY - Muito. Isso nos ajuda a lembrar por que fazemos o que fazemos e como é importante a nossa participação. Uma dessas atividades paralelas foi, inclusive, um pedido meu. Passei cinco meses como gerente de personagens no Magic Kingdom. Foi importantíssimo para mim, pois minhas experiências nesse período se transformaram nas histórias que conto hoje nos seminários. Contando histórias, estimulo uma área do cérebro dos ouvintes que fixa melhor informações, o que não aconteceria se simplesmente apresentasse os fatos. No fundo, faço o mesmo que a própria Disney faz: eu conto histórias.

Fonte: IstoÉ

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