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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Uma nova revolução industrial?

As notícias sobre o desenvolvimento da promessa ou declaração que o Brasil fará na COP-15 em Copenhague, em dezembro, são alvissareiras porquanto nosso país se inclui no rol daqueles que estão dispostos a fazer sua parte no esforço mundial de combate à mudança do clima. Há, no entanto, alguns alguns aspectos preocupantes.
Estamos hoje, de facto, embora não de direito, em um regime de "pledge and review" nas negociações internacionais sobre a mitigação da mudança do clima. Ou seja, os países se reúnem, fazem promessas, ou declarações de ações voluntárias, ou assumem compromissos, tanto faz. O fato é que anunciam perante a sociedade das nações o que pretendem fazer para limitar a mudança do clima a um máximo de 2ºC, limite esse que muito provavelmente será objeto de acordo de todas as nações em Copenhague. O cumprimento das promessas será revisto periodicamente no futuro. O não cumprimento submeterá o país respectivo à execração do mundo, pelo menos na imprensa.
O Brasil declarou que fará sua parte no esforço global, levando em conta que a responsabilidade de cada país é diferente, e que a responsabilidade histórica deve ser considerada.
A razão disso é que -no caso do dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa- o máximo de mudança do clima ocorre até 50 anos após a sua emissão. Por isso, os países que se industrializaram mais tarde do que a média mundial têm a sua responsabilidade, se medida pela mudança do clima hoje, menor do que se medida pelas emissões atuais ou pela mudança do clima daqui a 50 anos.
O fato de a história atenuar a responsabilidade relativa do Brasil, porém, não significa que tal responsabilidade seja nula.
No necessário e saudável debate sobre como obter as reduções de emissões, no entanto, as coisas não vão muito bem.
Primeiro porque o tema, como colocado na imprensa, parece ser o que o Brasil dirá em Copenhague. Espero que isso seja uma visão errônea do que efetivamente ocorre. Na minha opinião, o Brasil deverá levar a Copenhague um relato fiel do que faz e pretende fazer.
Ocorre que, no que diz respeito à diminuição de desmatamento, há um debate há vários anos, sobre como deve ser. O Congresso está envolvido na discussão, o que é importante.
Em outros setores, no entanto, fico com impressão que o assunto é tratado a portas fechadas, sem um debate público com as partes envolvidas. Das poucas notícias na imprensa, transpira uma ideia de que a definição da redução de emissões, pelo menos em outros setores, estaria sendo ajustada em função da taxa anual de crescimento do PIB do Brasil.
Neste ponto, as coisas realmente ficam preocupantes. É sabido que há uma correlação entre as emissões e o PIB dos países. Admitir tal correlação como premissa na formulação de política implica aceitar as razões substantivas que a validam, em particular as tecnologias utilizadas.
Ora, há evidências de que a redução necessária de 60% nas emissões globais de gases de efeito estufa somente será possível se forem modificados de forma radical os paradigmas atuais de geração e uso de energia (uma nova revolução industrial?). A modificação não ocorrerá naturalmente, será necessária a interferência dos governos, em todas as esferas, para induzir as mudanças necessárias. Preocupa-me o fato de que, pelo que posso apreciar, o debate em Copenhague tende a substituir o necessário debate nacional sobre como induzir as mudanças necessárias após o término da COP-15.

Luiz Gylvan Meira Filho, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, foi negociador brasileiro no Protocolo de Kyoto

Fonte: Folha de São Paulo

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