Os metais nobres que sobram no celular velho que ficou na gaveta podem virar receita nas mãos de quem já se atentou para esse mercado em potencial. E também o plástico, os circuitos e placas. Enquanto a média de produção de lixo eletrônico por ano está em 3,5 quilos, uma cadeia produtiva para dar destino útil a esses resíduos começa a caminhar no Brasil. De olho na lei de resíduos sólidos, que responsabiliza as fabricantes pelo recolhimento do que pode ser reaproveitado, criou espaço para surgimento de pequenas e médias empresas que começam a explorar a parte que lhes cabe nesse mercado – à estimativa é que o potencial de receita do mercado global de recuperação de lixo eletrônico em 2020 seja de US$ 21 bilhões.
“O e-lixo é um bem valioso que não se degrada na natureza. Achar e aproveitar esse mercado é maneira de transformar essa questão de problema em solução a partir do reaproveitamento dos componentes”, defende o professor Jamil Moysés, coordenador do MBA em Logística da FGV/IBS. E ele vai além: “Não me espantaria se, no futuro, as empresas que fazem a coleta desses resíduos nem cobrarem pelo serviço, apenas pelo direito de usá-los como produto”. Esse futuro já chegou para uma empresa de Betim, que não cobra para fazer essa coleta na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A divulgação da e-Mile - Empresa Mineira de Lixo Eletrônico ressalta: “Recicle seu lixo eletrônico sem sair de casa, agendamos coleta gratuita”. A administradora Fernanda Marciliana explica que o negócio é centrado na coleta e separação dos resíduos. “Aproveitamos quase todas as partes: a carcaça de plástico, os metais como alumínio, cobre, o aço e encaminhamos para as indústrias que tratam esses resíduos”, conta. O material segue para intermediários que até exportam o conteúdo.
“É mercado muito incipiente, que no Brasil tem muito a crescer. Aqui, por exemplo, não temos nenhuma indústria capaz de transformar o plástico da carcaça dos monitores de TV e impressoras. É um plástico especial, com substância antichama que demanda processo de reciclagem mais específico. Vai virar plástico reaproveitado na Europa”, detalha Fernanda. O quilo do plástico e do ferro, da maneira como a e-Mile repassa, custa R$ 0,20. Depois de beneficiado, chega a R$ 2. Atualmente, a empresa processa 50 toneladas por mês, entre diversos tipos de e-lixo. A perspectiva é dobrar essa quantidade a partir de parcerias com prefeituras, que são responsabilizadas, pela lei de resíduos sólidos, pelo tratamento adequado desse material.
Os equipamentos que têm placas, como celulares e computadores, por exemplo, são entregues para outra empresa, que tira proveito do e-lixo para fazer receita. Em euros. “Fazemos a triagem, com a separação de cada tipo de placa e a moagem desse material. Dali vai para a exportação, e então é feita a purificação dos metais nobres”, explica Flávio Melo, da Lorene Exportação e Importação, em Minas. A empresa tem 10 filiais Brasil afora e outras seis fora do país. Trabalha com grandes fornecedores como Nokia, LG, Samsung, Panasonic. Os negócios da Lorene crescem à invejável taxa de 20% ao ano, segundo Melo, exportando em média 300 toneladas por ano de eletrônicos para reciclagem.
Ele cita o exemplo da fábrica da Multilaser, em Extrema, no Sul de Minas, que cobra R$ 60 para a retirada de cada tonelada de e-lixo e gera cinco toneladas por semana. “Um parceiro local compra o material da fabricante, destrincha, desmonta e eu compro dele”, diz, ressaltando que a prática já faz parte da logística da empresa. O portfólio de celulares da Multilaser cresce acompanhando a entrada da classe C no mercado de smartphones, ou webfones. São aparelhos mais simples, que permitem acesso à internet e navegação em mídias sociais, a preços competitivos.
Mapa da coleta
O e-lixo Maps, ferramenta mantida pelo Instituto Sérgio Motta, é mapa interativo dos postos de coleta de resíduos eletrônicos. “Quem tem um posto faz o cadastro, nós checamos e colocamos no ar”, conta Sílvia Antibas, coordenadora do projeto. Já são 4 mil postos cadastrados, espalhados por todo o país. Mais de 60% dos estabelecimentos são focados em computadores e celulares, mas a ferramenta divide a navegação em mais de 112 variedades de lixo eletrônico – de lâmpadas a secadores de cabelo e geladeiras. Informações no site www.e-lixo.org.
Obsolecência do século 21
Semana passada, a Apple apresentou o novo iPad, ícone de desejo contemporâneo, excelente exemplo de como o consumismo tecnológico deturpa o bom senso. As novidades técnicas são pífias, mas o marketing da companhia induz a troca. A empresa atualiza o sistema que roda nos brinquedinhos e as versões anteriores do hardware passam a não dar conta dos novos sistemas, nem oferecem suporte ao upgrade. O equipamento fica lento, velho. E o pessoal troca. O volume de lixo que isso vai gerar em pouco tempo será espantoso. É a obsolescência programada do século 21. Quem singrar primeiro esse mercado e estiver atento às oportunidades pode fazer com o e-lixo o que a Apple fez com os tablets: inventou e manda no mercado.
Fonte: Pernambuco.com
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