Header

terça-feira, 8 de setembro de 2009

"A inteligência pode ser construída"


Cientista diz que a genética é importante, mas o ambiente é fundamental para o desenvolvimento intelectual de cada um.

Durante muito tempo, prevaleceu entre estudiosos da inteligência a ideia de que a capacidade intelectual tinha uma forte raiz genética - e que, por isso, aqueles que não tinham sido privilegiados pelos genes pouco poderiam fazer para aumentar seu desempenho. No livro "Intelligence and How to Get it" (Inteligência e como alcançá-la), lançado recentemente nos Estados Unidos, o pesquisador americano Richard Nisbett derruba esse conceito. Baseado em vários estudos, o cientista confirma que a inteligência tem um componente genético, mas isso não impede que seja construída e desenvolvida para além dos limites impostos pelos genes. Nisbett acredita que intervenções simples, em casa e na escola, contribuem para que cada criança alcance o máximo do desempenho intelectual. "E um dos primeiros passos para isso é ajudar as pessoas a acreditar que podem se tornar mais inteligentes", diz. Professor da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, ele deu a seguinte entrevista à ISTOÉ.

ISTOÉ - Quais as evidências de que o ambiente é mais importante do que a genética para a inteligência?

Richard Nisbett - Muitos pesquisadores superestimaram o papel da genética porque não levaram em consideração que os genes sempre interagem com o ambiente para ter um efeito. Um indivíduo com genes para ser alto está mais propenso a ter experiências que podem fazer dele um bom jogador de basquete do que outro com genes para ser baixo. Dependendo do jeito de analisar a questão, isto pode mostrar que a habilidade para o basquete é genética. Mas se você privar as pessoas mais altas de experiências com o basquete e der muitas oportunidades para as baixas de praticar esse esporte, você vai continuar achando que a habilidade para o esporte é genética - mas mostrando que quanto mais baixo você é, melhor você joga.

ISTOÉ - Quais as implicações da descoberta da importância do ambiente para a inteligência na vida das pessoas?

Nisbett - Quando as pessoas perceberem que a inteligência é algo que está substancialmente sob o controle delas, vão trabalhar mais duro para aprender e irão cobrar de maneira mais efetiva uma escola de qualidade melhor para seus filhos. Elas precisam acreditar que a inteligência pode ser construída.

ISTOÉ - Ser pobre ou rico interfere na inteligência?

Nisbett - Existe uma diferença na média do quociente de inteligência - QI - de ricos e pobres. Parte disso é resultante da genética. Pessoas mais inteligentes têm de fato genes que as predispõem a isso. E esses mesmos indivíduos costumam ter progresso na vida e melhorar seu status social. E eles acabam passando as duas coisas para seus filhos - os genes e a condição social.

ISTOÉ - Este tipo de informação não aumenta o preconceito ao avaliar as pessoas e suas capacidades com base na sua condição social?

Nisbett - Não se pode fazer generalizações deste tipo. Todos devem ser analisados conforme seus méritos. Minha crença no poder do ambiente para o desenvolvimento da inteligência me impulsiona a fazer o que for possível para que as pessoas alcancem o máximo potencial e lutem por uma melhor socialização e escolarização para seus filhos. Isto também me faz querer um Estado que ofereça uma educação melhor e que reduza as diferenças entre os padrões de vida das populações.

ISTOÉ - Mas, sem estas condições ideais, os pobres estariam condenados a ter um QI mais baixo?

Nisbett - Eles não estão condenadas a ser menos inteligentes. Há muitas ações que as populações com menor poder aquisitivo podem adotar para que seus filhos tenham um bom desenvolvimento intelectual.

ISTOÉ - O que, por exemplo?

Nisbett - Parar de criar os filhos para obedecer. A obediência é um valor que os indivíduos com menor poder aquisitivo tendem a enfatizar mais para seus filhos. E este valor não encoraja as crianças a atividades que possam deixá-las mais espertas.

ISTOÉ - Que outros equívocos os pais mais pobres cometem?

Nisbett - Eles lêem menos para seus filhos do que os mais ricos, perguntam menos sobre o entendimento das crianças a respeito das leituras. Enfim, estimulam menos, conversam menos.

ISTOÉ - Uma sociedade com maior número de pessoas com QI alto seria mais cooperativa e solidária?

Nisbett - Não tenho uma opinião formada a respeito disso.

ISTOÉ - Seria correto dizer que os países desenvolvidos dominam as relações no mundo porque seus cidadãos apresentam níveis mais altos de QI?

Nisbett - Acho que isso precisa ser visto de outro modo. As populações dos países desenvolvidos têm QI mais elevado porque suas sociedades demandam altos níveis de inteligência. Conforme as sociedades enriquecem, vão se tornando mais inteligentes. E, na medida em que vão ficando mais inteligentes, vão se tornando mais ricas.

ISTOÉ - Quais as razões que o levaram a afirmar que os japoneses e os judeus em geral apresentam inteligência superior?

Nisbett - Não acho que os japoneses têm uma inteligência superior. O que digo é que os asiáticos em geral fazem mais com sua capacidade intelectual do que nós, ocidentais. Eles costumam ter notas mais altas em exames, por exemplo, quando concorrem com outros estudantes. A socialização dessas crianças é muito diferente e tem como objetivo levar a um desempenho intelectual mais alto. É um pouco parecido com o que acontece com os judeus. Mas judeus, segundo pesquisas, realmente têm maior inteligência em comparação com quem não é judeu. Não sabemos ainda quais genes são responsáveis por este fato.

ISTOÉ - Como as escolas podem criar um ambiente mais favorável para melhorar o desempenho intelectual dos estudantes?

Nisbett - A primeira coisa é fazer com que os alunos passem mais tempo na escola - dias mais longos, semanas mais longas, anos letivos mais prolongados. Oferecer, claro, qualidade no ensino básico, mas também ter a preocupação de enriquecer o ambiente com atividades como música, arte, visitas a museus. O acesso ao que há de mais recente na informática também é essencial. Há programas de computador que fazem um ótimo trabalho ensinando matemática, leitura e ciências, em ações que podem ser feitas em conjunto com os professores. E é muito importante que todos acreditem que a criança pode aprender e alcançar o máximo de seu desempenho intelectual.

ISTOÉ - O sr. considera que é preciso investir mais dinheiro nas escolas?

Nisbett - Apenas colocar mais dinheiro nas escolas não significa muita coisa. Há outras medidas que podem dar bons resultados. Em geral, as melhorias podem ser feitas sem tanto gasto.

ISTOÉ - Por que o sr. diz que os professores responsáveis pelo atendimento a crianças menores, nos primeiros anos da vida escolar, são os mais importantes?

Nisbett - Na verdade, acho que eles são mais fundamentais ainda para as crianças mais pobres. Elas são menos estimuladas, de modo geral, e um professor ativo pode ajudá-las a superar essa deficiência, nem que seja parcialmente. As mais ricas têm em casa um ambiente que favorece seu desenvolvimento. Mas acredito que um bom professor é importante para todos os níveis de educação.

ISTOÉ - O sr. acha eficientes programas de incentivo para professores, como os que fazem reconhecimento por mérito?

Nisbett - Não tenho uma opinião sobre esse tema. Sei que os professores precisam ter melhor treinamento, o que envolve mais horas de prática de dar aula.

ISTOÉ - Qual a sua opinião sobre as escolas de período integral? Elas têm melhor resultado?

Nisbett - Sim. Não tenho dúvida em relação a isso.

ISTOÉ - O sr. poderia explicar o que chama de aprendizado cooperativo e por que considera o método promissor?

Nisbett - Resumidamente, trata-se de um jeito de ensinar que se baseia em dar à criança parte de uma informação necessária para que ela aprenda determinado assunto. Depois, ela vai dividir o que aprendeu com outra criança. Dessa maneira, as duas conseguem formar uma visão mais ampla do conhecimento e do processo de raciocínio.

ISTOÉ - De que forma os recursos como a internet influenciam o desenvolvimento da inteligência?

Nisbett - Sabemos que alguns sites têm excelente qualidade de informação e podem ser uma ferramenta muito útil na sala de aula. Mas eles devem ser usados em conjunto com outras atividades.

ISTOÉ - O que os pais podem fazer, em casa, para ajudar seus filhos a se tornar mais inteligentes?

Nisbett - Há coisas que fazemos instintivamente com nossas crianças e nem sabemos que estamos investindo no seu desenvolvimento. Uma delas é conversar com os pequenos e os jovens usando o vocabulário mais rico que tivermos. Inclua-os nas conversas dos adultos quando isso puder ser feito. Leia muito para as crianças. Outra recomendação é economizar em reprimendas e aumentar o encorajamento para que elas explorem o ambiente e façam as suas próprias descobertas.

ISTOÉ - O que mais?

Nisbett - Ensine seu filho a classificar os objetos e os eventos e como fazer comparações entre eles.

ISTOÉ - Qual o papel do autocontrole para a inteligência?

Nisbett - Este é um assunto que vem sendo muito estudado atualmente. Estou inclinado a achar que é grande a validade de aprender a manter o controle diante de determinadas situações. Um estudo mostrou que as crianças que sabiam se controlar e esperar pela recompensa apresentaram notas melhores quando ficaram adolescentes.

ISTOÉ - É possível escolher os amigos pelo QI?

Nisbett - É claro que sim. Você pode escolher seus amigos desse modo. Realmente escolhemos as pessoas para estar ao nosso lado também baseados na inteligência que apresentam. E também se sabe que as pessoas mais inteligentes têm mais amigos.

ISTOÉ - O sr. escolhe seus amigos pelo QI?

Nisbett - A inteligência das pessoas é algo que me faz sentir mais ou menos atraído por elas. Mas não sei o QI de muitos dos meus amigos. Apenas um esnobe ou tolo escolheria seus amigos somente por esse critério.

Fonte: IstoÉ Independente

Nenhum comentário:

Postar um comentário