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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Fonte renovável cresce mais depressa do que convencional; eólica é campeã, sem grande hidrelétrica; solar cresce 70% desde 2004

A consciência internacional sobre as consequências da emissão de gases de efeito estufa para o clima da Terra colocou o tema geração de energia de fontes renováveis em todas as mídias. O uso do etanol como combustível para o transporte foi visto, até não muito tempo atrás, como a alternativa indisputável para a gasolina. A crise, com a queda abrupta do preço do petróleo, minou ― temporariamente ― a viabilidade comercial dos biocombustíveis; por outro lado, a partir de um artigo do pesquisador Tim Searchinger publicado na revista Science em fevereiro de 2008, seu caráter sustentável passou a ser também disputável. A mídia registra com frequência a questão levantada na revista: se a disseminação dos biocombustíveis ― etanol e biodiesel, principalmente ― significará ou não, necessariamente, alimentos mais caros e mais destruição de florestas tropicais.

Na esteira dessa discussão ― a entrevista do pesquisador Lee Lynd é informativa sobre ela ―, o mundo assiste também ao crescimento do uso e da busca de outras formas de energia renovável. Hoje, só 8% da energia utilizada no planeta vêm de fontes renováveis: solar, eólica, geotermal, oceânica (das marés e correntes marinhas), hidrelétrica. O número, fornecido pela Energy Information Agency (Agência de Informações de Energia), "estatísticas sobre energia para o governo dos EUA", não inclui a energia provida pelos biocombustíveis ― que entra no total de energia fornecida pelos combustíveis líquidos. Assim, de acordo com a agência, dos combustíveis líquidos tiramos 36% da energia consumida no mundo em 2006; do carvão, 27%; do gás natural, 23%; das usinas nucleares, 6%.

Os dados ressaltam a importância de desenvolver combustíveis líquidos capazes de substituir os atuais para a contabilidade final das emissões de gases de efeito estufa ― deles vem a maior fatia do consumo mundial de energia. Os combustíveis líquidos movem aviões, navios, carros, caminhões. É nessa área que o Brasil aparece como liderança potencial de um novo mundo. Em 2006, sempre segundo o mesmo documento, a produção mundial de combustíveis líquidos chegou a 84,6 milhões de barris por dia; deles, 0,8 milhões vieram de biocombustíveis; todo o restante, de combustíveis fósseis.

O mesmo documento da agência (International Energy Outlook 2009) projeta em 11% a fatia das renováveis na geração total de energia para 2030, o mais rápido crescimento entre todas; a fatia dos combustíveis líquidos cairia para 32%, a do carvão subiria um ponto, para 28%, e as fatias do gás natural e da energia nuclear permaneceriam como estão. Para 2010, o documento projeta produção de biocombustíveis de 1,9 milhão de barris por dia (crescimento de quase 150%), com aumento da fatia frente à produção total de 86,3 milhões de barris por dia.

Nesse contexto, Inovação reuniu informações sobre a capacidade de geração de energia de outras fontes renováveis. Os números são pequenos ― referem-se, como mencionado, a 8% do total da energia produzida no mundo; mas trazem esperança ― embora partindo de uma base pequena, sua tendência de crescimento é forte. É importante não perder de vista que a crise mundial afetou o consumo atual; e seu final, ou a redução de seu ímpeto, poderá também afetar as tendências vistas de 2009.

Rede em torno de fontes renováveis

O Relatório do Estado Global das Energias Renováveis de 2009 da Rede de Políticas de Energia Renovável para o Século 21 (Renewable Energy Policy Network for the 21st Century), a REN21, uma rede mundial, com sede na França, para a promoção de energias renováveis formada por governos (inclusive o do Brasil), organismos internacionais como a ONU e a Comissão Europeia, e ONGs, registra a evolução nessa área. De acordo com o relatório, a potência disponível para geração de energias renováveis ― se incluída a potência de grandes hidrelétricas ― chegou em 2008 a 1.140 GW. Sem as grandes hidrelétricas, o numero cai bastante, para 280 GW, mas é saudado pelo relatório: segundo ele, um aumento de 75% desde 2004, quando a potência era de 160 GW. Para comparação, a potência da usina de Itaipu é de 14 GW.

O Brasil não aparece entre os cinco países com maior potência instalada renovável porque o relatório não contabiliza a energia gerada pelas grandes hidrelétricas, de importância capital para o País. São eles: China (76 GW), EUA (40 GW), Alemanha (34 GW), Espanha (22 GW) e Índia (13 GW). Os cinco também foram aqueles que, em 2008, mais adicionaram energia eólica à base instalada. No ano, o maior crescimento nominal em potência renovável veio da captação dos ventos. Atualmente, entre as fontes analisadas no relatório, a energia eólica é a rainha das renováveis, e responde por 43% da potência instalada.

O relatório constata que 2008 foi o primeiro ano em que União Europeia e Estados Unidos agregaram ao parque instalado de geração um percentual mais elevado de energias de fontes renováveis que de convencionais. Segundo o documento, naquele ano, a capacidade global de geração de novas fontes renováveis aumentou 16% em relação a 2007. O relatório não fornece o dado correspondente relativo às formas convencionais de geração de energia. Os investimentos para o aumento da capacidade instalada atingiram US$ 120 bilhões, quase o dobro dos US$ 63 bilhões de 2006.

Energia solar

Embora os ventos tenham gerado a maior parte da potência em energias renováveis em 2008, a geração de energia solar fotovoltaica conectada à rede elétrica continuou a ser, no ano, a tecnologia de geração que mais cresce no mundo: a capacidade global instalada saltou de 7,5 GW em 2007 para 13 GW, um aumento de 70% em relação a 2007 ― a partir de uma base pequena. No ano, a Espanha ampliou sua capacidade instalada de energia solar em 2,6 GW e assim se tornou o maior gerador do mundo dessa modalidade de energia. Ainda segundo o documento, a capacidade anual global de fabricação de equipamentos fotovoltaicos chegou no ano passado a 6,9 GW.

O relatório destaca o avanço da Alemanha, onde foram instalados 200 mil sistemas de aquecimento de água com energia solar durante 2008. No mundo, o aquecimento por energia solar cresceu 15% ― e atingiu 145 gigawatts térmicos (GWte). Nisto, a Espanha também sobressai ― há atualmente em desenvolvimento no país 22 projetos de geração térmica por energia solar, com capacidade instalada total de 1.037 MW, todos previstos para entrarem operação até o final de 2010.

Nos Estados Unidos, o preço dos equipamentos de energia solar para uso doméstico caiu em cerca de 40% desde a metade de 2008, noticiou o New York Times em 26 de agosto. O jornal aponta como causa a entrada da China na fabricação de painéis solares e de seus componentes. O governo Obama também oferece incentivos em dinheiro para quem investir em aquecimento solar. Glenn Harris, CEO do grupo de consultoria sobre energia solar SunCentric, apresenta seus cálculos na reportagem: nos lugares em que o preço da energia é maior, ambos os fatores farão o equipamento se pagar em 16 anos, ao invés dos anteriores 22.

O NYT reproduziu a previsão da empresa de consultoria Emerging Energy Research segundo a qual a demanda por painéis solares na Europa deve cair cerca de 26% por conta da crise econômica, principalmente por causa do desempenho do mercado na Espanha, que foi muito afetada pela crise e cortou subsídios que oferecia a compradores. Em compensação, diz o diário, nos Estados Unidos as vendas aumentaram significativamente. Na Califórnia ― segundo o New York Times de longe o maior mercado do país ―, o número de instalações de painéis domésticos em julho foi 50% maior que no mesmo mês no ano passado. Hoje pelo menos 14 Estados permitem a amortização de gastos na compra de equipamentos para geração de energia solar ― o governo paga e o contribuinte o reembolsa com impostos mais altos até a dívida ser quitada.

Energia eólica

Conforme o relatório da REN21, a capacidade de geração eólica, comum na Europa e nos EUA, aumentou 29% em 2008, atingindo 121 GW. Isso é mais do dobro da capacidade instalada em 2005; como já mencionado, significa 43% do total produzido pelas fontes renováveis listadas no documento. Ali também se destaca que, no ano passado, a China dobrou sua produção de energia eólica pelo quinto ano consecutivo, alcançando 12 GW e já superando em 20% a meta que havia estabelecido para 2010, de 10 GW.

O Conselho Global de Energia Eólica (Global Wind Energy Council, GWEC) faz uma estimativa otimista: para ele, a energia eólica respondeu por 1,3% do consumo global de eletricidade em 2008. Provêm da energia eólica, diz o GWEC, 19% da eletricidade gerada na Dinamarca, 9% na Espanha e em Portugal e 6% na Alemanha e na Irlanda. A capacidade instalada dos Estados Unidos, um dos grandes produtores do mundo, atingiu 25,1 GW no ano passado. Sempre segundo a entidade, o setor estima que a capacidade instalada desse tipo de energia no planeta vai triplicar até 2013, para 332 GW ― a previsão para 2013 é de 56,3 GW de expansão. No período 2008-2013, no entanto, o ritmo anual de crescimento será de 22%, inferior aos 28% verificados entre 1998 e 2008.

Em maio de 2009, um consórcio integrado por uma empresa alemã, uma dinamarquesa e uma de Abu Dhabi acertou participar com 2 bilhões de libras (R$ 6,1 bilhões) da construção da primeira fase do London Array ― complexo de captação da força dos ventos de 144 km2 a ser instalado no estuário do rio Tâmisa, a 20 quilômetros da costa leste da Inglaterra. Segundo o jornal britânico Guardian, o consórcio espera completar em 2012 o estágio inicial do projeto, em que 175 turbinas gerarão 630 MW. A segunda fase, ainda sem data de início prevista, vai gerar mais 1 GW, o bastante para abastecer de energia ¼ da região metropolitana de Londres. O projeto faz parte da iniciativa de longo prazo do governo britânico, que quer gerar 25% da demanda de eletricidade do país ― 33 GW ― por meio de energia eólica.

Energia oceânica (correntes marítimas e marés)

Essa fonte gera potência pequena, às vezes medida em megawatts ― e não em gigawatts. Em setembro de 2008, a primeira estação do mundo a aproveitar a energia das ondas foi instalada 5 quilômetros ao largo de Aguçadoura, na costa norte de Portugal. O Parque de Ondas da Aguçadoura funcionou alguns meses com três máquinas Pelamis P-750, britânicas, que geram 2,25 MW de energia ― mas agora está em reparo. Um problema técnico nas articulações dos macacos hidráulicos das máquinas, segundo a agência de notícias portuguesa Lusa, fez com que a operação fosse temporariamente suspensa. Os equipamentos foram removidos para terra firme no início do ano. Se o problema for solucionado, os planos são de aumentar a geração para 21 MW, com a incorporação de outras 25 máquinas.

Também no começo de 2009, o governo britânico anunciou planos de aproveitar a força do oceano no estuário do rio Severn, entre a Inglaterra e o País de Gales, na costa oeste da Grã-Bretanha. Ali, onde a variação da maré só é inferior à da Baía de Fundy, no Canadá, um projeto prevê a construção de uma barragem de 16 km de extensão, a Cardiff-Weston, capaz de gerar 8 GW ― 5% das necessidades de energia da Grã-Bretanha, informou também o Guardian. Parte do mesmo complexo, as barragens de Shoots e Beachley produzirão 1 GW e 625 MW respectivamente, e as lagoas artificiais de Bridwater Bay e Fleming outros 1,36 GW cada.

No final de agosto, o jornal londrino noticiou o plano da geradora ScottishPower de implementar um projeto de geração de energia a partir da força das marés no canal entre a ilha de Islay, na costa da Escócia, e a terra firme, onde a água se movimenta à velocidade de até três metros por segundo. Está prevista a instalação de dez turbinas submarinas de trinta metros, capazes de gerar 10 MW de energia, o suficiente para abastecer de eletricidade durante 23 horas por dia os 3.500 habitantes e as oito destilarias da ilha. Se as coisas evoluírem como planejado, o projeto entrará em operação em 2011, noticiou o Guardian.

Energia geotermal

O relatório da REN21 informa que a capacidade instalada de geração de energia termal atingiu 10 GW em 2008. O líder na área é os EUA, onde no início de 2009 existiam 120 projetos em andamento, para gerar no mínimo 5 GW. O documento destaca também Austrália, El Salvador, Guatemala, Indonésia Islândia, México, Nicarágua, Papua Nova Guiné, Quênia e Turquia como países em que o uso desse tipo de energia está em expansão. Por outro lado, o aproveitamento da energia geotermal bombeada do subsolo atingiu 30 GWte, estima a REN21. Ainda segundo estimativa da organização, outros usos diretos de calor geotérmico, como o aquecimento de ambientes e estufas e utilizações na agricultura e na indústria, chegaram a 15 GWte. Pelo menos 76 países fazem algum tipo de uso de energia geotermal, diz o relatório.

Para geração de energia geotermal, perfura-se o solo em busca de áreas quentes do subsolo. É esse calor que é aproveitado na geração de energia. Sua viabilidade, no entanto, enfrenta agora as preocupações com a segurança nos Estados Unidos. Uma planta geotermal na Alemanha teria, segundo cientistas, gerado um terremoto na cidade de Landau in del Pfalz, próxima à fronteira com França e Luxemburgo. A planta continua em operação enquanto uma comissão analisa sua segurança. De acordo com a edição do New York Times de 10 de setembro, outros dois projetos similares trouxeram preocupações também similares: um na Califórnia, que está em exame pelo Ministério da Energia dos EUA; outro, na Suíça, fechado por ter causado terremotos em 2006 e 2007, que aguarda a decisão de um grupo de cientistas para ser ou não reaberto.

Organismo internacional

Ainda no início deste ano, no final de janeiro, foi oficialmente criada a Agência Internacional de Energia Renovável (International Renewable Energy Agency, Irena). Dirigida provisoriamente por Hélène Pelasse, especialista do Ministério da Ecologia, da Energia, do Desenvolvimento Sustentável e do Mar da França, a organização tem sede temporária em Abu Dhabi; seu centro de tecnologia e inovação será em Bonn, na Alemanha, e seu escritório de articulação de cooperação com outras entidades que atuam no setor vai se localizar em Viena. Segundo o site da agência, a Irena aspira se tornar "a principal força na promoção do uso amplo e sustentável de energias renováveis em escala global".

Em seu relatório de 2008, a REN21 registra a criação da organização e observa que "era visível a ausência de uma agência multilateral dedicada às energias renováveis no panorama internacional". A Irena, diz o documento, vai oferecer assessoria e apoio a governos do mundo todo sobre políticas de energias renováveis, capacitação e transferência de tecnologia, além de facilitar o fluxo de financiamento e know-how. Dentre seus atuais 136 membros não constam ainda alguns países importantes, como o Brasil, a Rússia, o Canadá, o México, a África do Sul e a Indonésia.

Fonte: Inovação Unicamp

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